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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O tempo

Eliane F.C.Lima

Colecionava páginas de calendário. Ia enfiando na gaveta para guardar os acontecimentos. Um dia, sem mais nem menos, colocou-as lado a lado sobre a mesa. Olhava para elas. Estava ali o passado. Ano a ano. Reconhecia algumas datas. O aniversário, a morte da tia. Porém, por mais que olhasse, não ouvia suas vozes. Eram páginas mudas. Mortas. Era como se o tempo que escorreu estivesse trancado em um cofre. Inacessível. Então fechou os olhos e lembrou o dia da morte da tia: o telefonema, o táxi, as pessoas, a tarde toda, o enterro. Agora o passado falava, tinha som, tinha cor, movimento. O passado revivia no presente. Viu que apenas o presente existia. De olhos fechados, ainda, pensou no futuro. Era mais difícil ainda, nenhuma imagem para ajudar. Grande esforço de concentração encenar o futuro. Que era isso: acontecia como representação de teatro, pura ficção. Enorme criatividade, sua mente era um talentoso dramaturgo. Mas nenhuma certeza. Abriu os olhos, o presente era momentâneo e certo: sobre a mesa muitas páginas de calendário. Todas mudas.

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