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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Invencível batalha

Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais)

Intrépido era o adjetivo que classificava aquele homem. Nascido na Idade Média, seria cavaleiro heroico de algum rei conquistador.
Tinha nascido, porém, no século XX, vida de cidade moderna e grande.
Defrontava-se, mesmo assim, com muitas batalhas, principalmente as sociais. Talvez até mais acirradas. Não se via o inimigo, quando era o próprio Estado, por exemplo, ferindo seus direitos. Mas não se intimidava, procurando as vias legais ou levando seus concidadãos para as ruas, se necessário. Enfrentou a polícia, seguidamente, braço armado do stablishment para manter-se stablishment. Era um corajoso líder.
E até na vida pessoal. Não ficava quieto, se o síndico do prédio ou algum vizinho, ou qualquer um, seja dita a verdade, lhe faltasse com a devida consideração. Nunca levou desaforo para casa. Direito era direito.
Não que fosse um sujeito de perder as estribeiras, afeito a brigas. Não. Era até muito ponderado, tentando fazer o outro entender o erro cometido. Mas até um limite. Daí para a frente, agia conforme o preciso, embora sem perder as rédeas de seus atos.
Naquelas férias, meio cansado da lide urbana, tinha ido para a casa de uns amigos, localidade rural, mato para todo o lado, pouca gente e muito silêncio. Ideal para um recompor-se, beber vinho à noite, conversar muito, dormir cedo e acordar mais cedo ainda, cheiro de mato molhado de sereno, entrando pelas narinas. Surpreender o sol saindo de sua cama.
Boca ainda cheirando a café com leite e bolo de milho, resolveu passear pelos matos.
E foi andando, descobrindo pequenas trilhas feitas por outros pés curiosos, florezinhas sem pedigree, mas com muitas cores e graças, juntinho ao rosto.
Até que, de repente, a vegetação cerrada abriu e o caminhozinho ladeou uma várzea não imaginada. E viu o único adversário que temia nessa vida: um boi. Aliás, vários deles, amontoados, pastando, sua boca mole para lá e para cá. E seus chifres.
Um deles o olhou tão surpreendido quanto o homem. Continuou, no entanto, seu processo de movimentar o queixo, sem perdê-lo de vista. Ele fez o mesmo, por sua vez.
Estando aqueles a distância, reuniu toda a sua coragem e continuou pela trilha, o olho firme, porém, para o boi.
Dez metros adiante, quando volta a cabeça, finalmente, para a frente, todo o pelo que tinha no corpo se eriçou: pela mesma minúscula vereda, um boi atrasado vinha trotando.
Sem ter onde se esconder, puro instinto, descarga de adrenalina enchendo suas artérias, virou-se de costas e voltou, caminhando o mais depressa que podia, sem correr, para não estimular o terrível animal a fazer o mesmo. Em nenhum momento olhou para trás, cuidado para não desafiar o opositor.
Só parou na segurança do portãozinho familiar e amigo, muito tempo depois, vista escura, pernas bambas. Por sorte, naqueles ermos não tinha topado com vivalma. Mesmo a pessoa mais heroica sempre encontra um desafeto impossível de enfrentar.



2 comentários:

ju rigoni disse...

Sempre muito mais difícil enfrentar o que vai por dentro. Adorei o conto!

Bjs, querida. E inté!

Tais Luso de Carvalho disse...

Sempre temos algo mais desafiador pela frente, sempre temos algo a temer, afinal, super-homem só se encontra em historinhas para crianças, e na verdade, não sei a razão para incutir tal engodo nas pobres criaturas. Mas são os ditos heróis. Gostei muito, Eliana, prendeu do começo ao fim.
Li o primeiro conto, também, do trio genro, sogra e filha. Ótimo!

Beijos, amiga.