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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Guerra santa?


Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais - RJ) 

Abriu o papel colocado em sua caixinha de correio. Era uma pregação religiosa, escrita em um papel pautado e de mau gosto. “Que abuso!”, pensou. Quem deu autorização para aquilo ser colocado ali? 
Perguntado, o porteiro disse que não sabia de nada. Não tinham pedido autorização ao síndico. 
Podia reclamar, proibir a colocação em seu escaninho. Mas preferiu outro caminho.
Já em casa, escreveu outra mensagem contestanto todas as palavras. Fechou, assinando-se “um ateu.” Como não sabia de quem se tratava, fez várias cópias e colocou de volta, no espaço do correio de todos os apartamentos.
Não sabendo igualmente a origem da resposta, outra mensagem do asceta foi escrita, refutando a segunda e colocada, de novo, coletivamente.
Quando chegou, à tarde, ao pegar as cartas rotineiras, novamente um ataque de raiva. Foi direto responder, agora já subindo o tom.
No dia seguinte, perscrutou sua caixinha do correio, bastante ansioso. O prédio inteiro já acompanhava a disputa. 
Sentado no sofá, viu que o outro também recrudescera na resposta. Era digna de um cruzado, de um templário, de um evangélico indignado. Chamava-o de ímpio, dizia-o capazes de coisas atrozes, punha em pessoas iguais a ele a culpa por crimes hediondos, recentemente cometidos – eram citados todos, um a um. 
Os comentários começaram a grassar. O síndico já estava disposto a descobrir quem eram os dois engraçados e a acabar com aquilo, mas os vizinhos disseram que não. Acompanhavam o caso, como quem acompanha uma novela. 
Como ouviu, por acaso, no elevador, uma conversa em que um dos moradores falava da intenção do síndico de descobrir e multar os dois, o primeiro missivista resolveu recolher, pelo menos temporariamente, seu sermão religioso. O outro, como não recebesse mais nenhuma provocação, também ficou silencioso, aguardando a próxima jogada do oponente.
Quem não gostou nada daquilo foram os outros moradores, que tinham garantido muita gargalhada no final da tarde. E, estranhamente, as caixinhas do correio começaram a ser inundadas por uma coleção variadíssima de provocações de ateus e pregadores, dos mais variados estilos. 

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Um comentário:

Célio Passos disse...

Gostei do conto. Delicioso.Inspirador.
Até apetece ser morador desse prédio.
Neste conflito religioso nenhum saírá vencedor, para mais se entrarem pelo fanatismo.
José Lobo