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domingo, 27 de maio de 2012

Volúvel

Eliane F.C,Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais)

Observa da sacada o que o vento faz com um papel que roubou, indomável ladrão, de uma janela desavisada, no fim da rua: imprensa-o contra um muro em suas mãos invisíveis. Desde que caiu ali, o vento se diverte com ele, sem piedade. Só quando se cansar da vingança ou por sorte o desgraçado cair no bueiro próximo, estará findo seu suplício.
Oprimido pela visão, sabe exatamente o que o pequeno mártir está passando. É exatamente assim que a vida fez com ele. Há muitos anos que um vendaval o joga daqui para ali, igualmente tonto, igualmente indefeso, igualmente vítima de uma vingança. De qual, não sabe. Quem saberá? Tantos passam pelo mesmo.
Vivia tranquilo, inconsciente de sua felicidade. Que a gente só sabe da felicidade, quando não tem mais. Sem grandes exageros, ia seguindo seus dias de perfeição.
Até tudo virar. Teresa morreu de repente. O filho resolveu trabalhar em outra cidade. A filha, sempre tão séria e estudiosa, se apaixonou por um malandro. Criticada, relacionamento não aceito, foi embora com o tal.
E ele ficou ali, sozinho, tentando se agarrar nas lembranças boas do passado, as lufadas de vento forte já rodopiando com ele. E vieram as doenças: uma, duas, três. O médico disse que a causa era a depressão, o estresse dos problemas. A causa não importa. Ao papel, só lhe interessa que o vento pare ou que ele seja empurrado para dentro do bueiro escuro.

Sua visita é aguardada em Literatura em vida 2 (link) e Poema Vivo (link).

3 comentários:

Luciene disse...

Um excelente texto, também muito bonito. Destaco uma frase que me chamou muita a atenção: "Que a gente só sabe da felicidade, quando não tem mais."

Abraços.

Marise Ribeiro disse...

Vivemos ao sabor do vento, ou seja, da vida, que vai nos empurrando sem que, às vezes, tenhamos o controle da direção. Como todo o vento, há momentos de calmaria e de turbulência.
Belo texto, Eliane! Demorei a vir, mas aqui estou eu me deliciando com os contos.
Beijos,
Marise

cirandeira disse...

Eliane,continuo sem conseguir postar comentário no 'literatura...' (!?), quem sabe consigo por aqui!
Muito interessantes teus textos, tens uma imaginação muito rica!!!

um abraço