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domingo, 16 de janeiro de 2011

Destino

Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais - RJ)

Às vezes, quando volta da escola, pega o ônibus mais barato. Só quando está com paciência. Criança, a barriga gritando por comida. O veículo vai por lugares não imaginados. Alguns muito bonitos: fazendas, gado, aves pernaltas e brancas junto a eles, casas grandes entrevistas no amontoado de árvores.
Mas há casinhas pobres, sofás rasgados nas varandas. Para quem? Lá dormem gatos e cachorros da casa e até vira-latas da rua.
Uma sempre lhe atrai o olhar, quando passa. Desde a primeira vez, quando nunca vira. Pois mesmo não tendo visto, sabia tudo. Sabia até o que havia por dentro. Um quadro de um casal, muito antigo, coisa do final do século XIX, preto e branco, na parede, a mulher abotoada até o pescoço, o homem, um bigode farto. Outro sofá bem grande. Verde. Um móvel na horizontal, dos que não se encontram mais. Uma cristaleira no canto, só achada, hoje, em antiquário. Um quarto só, com a porta dando para a sala.
Uma cortina estampada com motivos também verdes separa os cômodos da cozinha pequena, atrás, dando para um avarandado com telheiro de zinco. Ao fundo, uma hortinha.
Um sentimento confuso enche o peito. É atraído, mas tem medo. Uma mulher mexe nas hortaliças e ele lembra seu nome: Elvira. É fornida de carne e morena, os cabelos presos para cima, relaxadamente. Mas fica linda. Quando abaixa, os seios redondos brotam do decote, vêm saudar as couves, os tomates, as salsinhas.
Parece que vai sentir saudade, porém um sentimento de horror e ódio, mais forte, atropela o outro.
Quer tirar a casa e Elvira da cabeça. Ela, porém, está beijando um rapazote, um buço despontando, atrás de uma mangueira enorme, no fundo de um terreno baldio.
Aos poucos se deitam no chão. Ela levanta a saia comprida do vestido vagabundo, para que o meninote se decida rápido. E tão enlouquecidos se tornam que não veem um vulto chegar, facão de cortar mato na mão.
Com a mão no peito, ele abre os olhos e vira o rosto para a janela. Quer se concentrar na paisagem, que, recentemente, começou a conhecer. O coração, entretanto, ainda sacode violentamente.
Quando o ônibus para, muito tempo depois, ainda não está sereno. Mochila às costas, cadernos e livros dentro, salta meio sonâmbulo ainda, medo de novamente encontrar Elvira.

Convido o visitante deste blogue a ir a Poema Vivo (por aqui), onde há um novo conto meu e a Literatura em vida 2 (o caminho é esse).

Estou ainda em:
1.
Debates Culturais, onde passo, agora a publicar alguns artigos, bastando um clique, na lista "Colunistas", à direita, em Eliane Lima (link).
2
.
Recanto das Letras (aqui).
3. Portal Literal (aqui).
4.
Alma de Poeta (aqui).

2 comentários:

Guidinha Pinto disse...

Demorei a vir aqui, mas quis esperar um pouco. Li o conto e fiquei desconfortável...
Agora a realidade. Depois das águas que caíram e das imagens que entraram casa adentro nos mostrarem a desgraça em que se transformou o seu Estrado, com pesar transmito que lamento muito as vossas perdas.
Com a Eliane, desejo que esteja tudo bem, mas mande notícias. Só um olá e fico sossegada.
Beijo.

ju rigoni disse...

Difícil vencer os obstáculos do caminho interior...

Adorei o conto, amiga! Bjs e inté!