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domingo, 6 de novembro de 2011

Quase uma onda verde

Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais - RJ)

Eram muito preocupados com o meio ambiente. Filiados ao Greenpeace, assinavam todos os manifestos a favor do futuro do planeta. E de proteção às baleias, bebês-focas, peixe-boi, todos os animais em extinção, enfim.
E tome de sacola e papel recicláveis, de lixo com separação seletiva, óleo queimado recolhido em garrafa para ser reaproveitado. Não havia um comportamento ecológico correto que o casal, tomando conhecimento, não passasse a ter, religiosamente.
Compraram, um dia, um terreno na serra, muito verde, clima especial, ar puro, uma cascatinha ao fundo, uma visão magnífica do lugar, no alto da colina. Duas árvores frondosas, cheias de ninhos de pássaros. Exigiram do arquiteto uma planta que deixasse as duas em paz e garantisse a sobrevivência de seus moradores naturais. As aves estavam no mesmo nível que as baleias, não vê?
Quiseram teto que captasse a energia solar, reaproveitamento da água do banho para a privada, caixa d'água que recolhesse a água da chuva para molhar plantas, lavar varandas.
Quando a obra ia começar, o terreno teve de ser limpo. Lá se foram todos os viventes daquele mato enorme. Correram cobra, lagarto, sapo. Apesar de terem ficado preocupados, ainda havia muito mato em volta para eles se abrigarem, o marido ponderou.
Casa pronta, foram passar as férias lá pela primeira vez. À noite, céu tão estrelado que parecia com risco de cair na cabeça. Quando o homem se sentou na varanda, o que lhe caiu em cima foi uma lagartixa. Deu um pulo, dando um monte de safanões e não pôde segurar um “Que bicho nojento!”. A mulher, ao lado, caiu na gargalhada, mas ficou de olho vivo em duas outras que passeavam calmamente. Todas estavam ali, desde que a obra tinha começado, para comer os mosquitos, que vinham aos montes, fartar-se com o sangue dos operários.
Só então os dois, que já tinham começado a se estapear por causa deles, notaram que a casa, janelas todas abertas, estava invadida por uma nuvem.
Passaram a noite acordados, porque não tinham trazido aqueles aparelhinhos elétricos de inseticida, imagine, logo eles, tão conscientes. Nem repelente.
Dia seguinte, foram a um supermercado no centro e, relutantes, tiveram de comprar.
Antes de escurecer, tristonhos, foram fechando as janelas. Que perdoassem os mosquitos. Nenhum dos dois, no entanto, teve coragem de confessar que não queriam também as lagartixas.
Cansados da noite anterior, de muito folguedo na água gelada do laguinho da cascata, caíram na cama e dormiram. Até sentirem alguma coisa andando debaixo das cobertas. Saltaram em um pulo. Luz acesa.
Uma aranha enorme e peluda, vinda do mato, corria sobre as cobertas. Pulou no chão e sumiu.
Passaram boa parte da noite procurando, ansiosos para dormir, meio sonâmbulos. Foi, quando a mulher vislumbrou-a correndo em direção à porta. Chinelo na mão, instinto puro, nem pensou, caiu-lhe em cima. As aranhas enormes e peludas não estão no mesmo nível das baleias.

Aguardo sua visita ainda em meus blogues Poema Vivo (aqui) e Literatura em vida 2 (aqui).




























2 comentários:

Marise Ribeiro disse...

Pra mim, as aranhas jamais estarão no mesmo nível das baleias. Se eu pudesse exterminava todas rsrsrs
Adorei o conto!
Beijos,
Marise

ju rigoni disse...

A mais pura essência da incoerência.

Maravilha, mestra! Bjs e inté!