Eliane F.C.Lima (Registrado no Escritório de Direitos Autorais)
Era muito pacato. Aquele bom amigo com quem todo mundo desabafa. Prestativo, que auxilia o colega na hora do trabalho acumulado.
Mas tinha suas brincadeiras secretas. Aproveitava-se da neurose urbana.
Punha uma touca de tricô na cabeça, uma calça de brim bem desbotada, uma camiseta preta, uma mochila nas costas. Mochilas estimulam a imaginação: para que aquele homem está com aquela mochila? O que haverá lá dentro?
Saía de noite, umas oito horas. Parava em uma rua pouco movimentada, em frente a uma casa. Do outro lado da rua. Perto de uma árvore. E ficava ali, olhando para uma janela. Sempre acontecia de aparecer alguém. E vê-lo. Olhavam um pouco e entravam. Podia apostar: daqui a pouco, olha a tal cara de novo. Agora meio escondida atrás da cortina.
Vinha um, vinha outro, às vezes muitas pessoas juntas. Ninguém podia acusá-lo de nada. Nada fazia.
Tinha documentos na bolsa, era alto funcionário público, bem colocado na vida funcional. E na bolsa, não havia nada de perigoso. Nem arma, nem máquina fotográfica. Só coisas que um cidadão pacato e dentro da lei tem.
Tinha ainda uma boa desculpa. Estava ali esperando um amigo que havia marcado com ele. Iam pegar a mulher dele que estava de plantão em um hospital. Não sabia o que havia acontecido, por que ele ainda não tinha vindo. Tinham combinado de tomar um vinho, até a hora dela sair. Vai ver o carro dele tinha quebrado, o amigo já vinha reclamando de um barulho. Imaginem que ele não tinha trazido o celular para receber o aviso do outro.
Ficava até umas duas horas da manhã. Até ter certeza de que os moradores da casa tinham passado boa parte da noite em claro. E estavam com muito medo. Dispostos a chamar a polícia.
Na primeira vez em que a janela ficava vazia, ia embora, pegava o carro que tinha deixado em outra rua.
Era a pessoa mais pacata do mundo. Qualquer amigo colocava a mão no fogo por ele.
Era muito pacato. Aquele bom amigo com quem todo mundo desabafa. Prestativo, que auxilia o colega na hora do trabalho acumulado.
Mas tinha suas brincadeiras secretas. Aproveitava-se da neurose urbana.
Punha uma touca de tricô na cabeça, uma calça de brim bem desbotada, uma camiseta preta, uma mochila nas costas. Mochilas estimulam a imaginação: para que aquele homem está com aquela mochila? O que haverá lá dentro?
Saía de noite, umas oito horas. Parava em uma rua pouco movimentada, em frente a uma casa. Do outro lado da rua. Perto de uma árvore. E ficava ali, olhando para uma janela. Sempre acontecia de aparecer alguém. E vê-lo. Olhavam um pouco e entravam. Podia apostar: daqui a pouco, olha a tal cara de novo. Agora meio escondida atrás da cortina.
Vinha um, vinha outro, às vezes muitas pessoas juntas. Ninguém podia acusá-lo de nada. Nada fazia.
Tinha documentos na bolsa, era alto funcionário público, bem colocado na vida funcional. E na bolsa, não havia nada de perigoso. Nem arma, nem máquina fotográfica. Só coisas que um cidadão pacato e dentro da lei tem.
Tinha ainda uma boa desculpa. Estava ali esperando um amigo que havia marcado com ele. Iam pegar a mulher dele que estava de plantão em um hospital. Não sabia o que havia acontecido, por que ele ainda não tinha vindo. Tinham combinado de tomar um vinho, até a hora dela sair. Vai ver o carro dele tinha quebrado, o amigo já vinha reclamando de um barulho. Imaginem que ele não tinha trazido o celular para receber o aviso do outro.
Ficava até umas duas horas da manhã. Até ter certeza de que os moradores da casa tinham passado boa parte da noite em claro. E estavam com muito medo. Dispostos a chamar a polícia.
Na primeira vez em que a janela ficava vazia, ia embora, pegava o carro que tinha deixado em outra rua.
Era a pessoa mais pacata do mundo. Qualquer amigo colocava a mão no fogo por ele.
Um comentário:
Esse conto é um alerta. Será mesmo que ainda existem pacatos cidadãos? Grandes cidades, hoje, assemelham-se a selvas. Se ainda não se é totalmente selvagem como viver tranquila e confortavelmente, nelas? Como sair à rua ignorando, por exemplo, a guerrilha urbana? São muitos os desvios a serem considerados, e todos com capacidade para desestruturar personalidades. Ninguém conhece ninguém... Quão difícil é, hoje, confiar plenamente num indivíduo...
Bjs, Eliane, e inté!
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